A Amazônia sempre foi considerada inadequada para a produção de soja, mas o melhoramento genético aumentou o potencial de produção no bioma. O cenário de risco, somado ao corredor de escoamento de grãos que se desenha ao Norte, preocupa ambientalistas.
O potencial de ameaça da soja sobre a Amazônia é apontado no relatório “O crescimento da soja: impactos e soluções”, da organização não governamental WWF. Trata-se de um amplo levantamento da produção e comercialização da commoditie no mundo.
“Sabe-se que 20% da Amazônia Legal tem aptidão para produzir grãos e desde 2002 pesquisadores estudam variedades de soja que podem se adaptar por lá”, diz Cynthia Cominesi, analista de conservação do programa Agricultura e Meio Ambiente do WWF-Brasil.
“A pesquisa está fazendo o seu papel, mas vemos este quadro com preocupação”, continua. “A pressão pelo plantio de soja na Amazônia aumentará, com a demanda global crescente, e pode repetir a cena do Cerrado. Há 20 anos não havia soja no bioma em função da aridez. Mas a pesquisa encontrou novas variedades e hoje a grande produção ocorre ali. O mesmo pode acontecer na Amazônia. ”
Há outros impactos colaterais que podem ter efeito sobre a floresta. Boa parte da expansão da soja no Brasil se dá em terras que eram usadas pela pecuária. Se este fenômeno, de um lado, é positivo, pode empurrar o gado para a Amazônia e causar desmate.
A bem sucedida moratória da soja, pacto entre ambientalistas e a indústria que existe desde 2006 e pressupõe que não se compre soja de áreas que tenham desmatado a Amazônia, também tem seu lado ameaçador – no caso, sobre o Cerrado. “O problema é que quando se elabora algo como a moratória pode ocorrer um avanço sobre o bioma mais próximo, no caso, o Cerrado. Este processo não é exclusivo do Brasil, é do mundo inteiro”, diz Pedro Miguel, coordenador do Programa de Agricultura e Meio Ambiente do WWF-Brasil.
No Cerrado, diz o estudo, está cerca de 5% da biodiversidade mundial – mais de 11 mil espécies de plantas, quase a metade não é encontrada em nenhum outro lugar. Além disso, é uma matriz importante de água (seis das principais regiões hidrológicas do país têm suas fontes ali, inclusive o Pantanal). Mas, desde 2000, soja, milho, algodão e cana-de-açúcar ocuparam áreas extensas no bioma. O WWF estima que o cultivo de soja ocupe entre 13 e 15 milhões de hectares de Cerrado, ou algo próximo ao território da Inglaterra.
“Se a alteração na vegetação continuar com os índices de 2004 – 2 a 3 milhões de hectares por ano -, o ecossistema natural do Cerrado poderá virtualmente desaparecer nas próximas três décadas”, diz o estudo. “Nosso trabalho daqui para frente é criar mecanismos para salvaguardar as maiores extensões possíveis de ativos naturais”, diz Miguel.
Ele lembra que o Brasil está na vanguarda da certificação de soja. Aqui existem 470 mil hectares de soja certificada – a China tem 27 mil hectares. “A certificação é importante porque acopla uma série de medidas mitigadoras em relação à emissão de gases-estufa e manutenção do solo”, diz Miguel.
Fonte: Valor Econômico