Um novo medicamento voltado ao tratamento da mastite bovina acaba de ser disponibilizado para empresas farmacêuticas do setor privado. O produto, que usa nanotecnologia e foi desenvolvido pela Embrapa Gado de Leite (MG) e Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP, é a mais nova aposta da pesquisa agropecuária para enfrentar a doença que afeta rebanhos leiteiros em todo o mundo. Acredita-se que uma em cada quatro vacas desenvolva a mastite, a inflamação da glândula mamária, pelo menos uma vez ao longo de sua vida produtiva. Será publicado nos próximos dias edital que visa buscar parceiros na indústria farmacêutica para a produção e comercialização desse novo medicamento.
Embora o Brasil não possua números oficiais dos prejuízos causados pelo problema, estima-se que o impacto alcance até 10% do faturamento das propriedades. O pesquisador Guilherme Nunes de Souza avalia que, somente nos Estados Unidos, onde as estatísticas sobre a doença estão mais avançadas, a mastite provoque perdas anuais da ordem de dois bilhões de dólares por ano devido à redução na produção, ao descarte do leite e de animais e aos custos com medicamentos e honorários veterinários.
Uma das respostas da pesquisa agropecuária a essas perdas está na nanotecnologia, ciência que manipula partículas em escala microscópica (até um bilhão de vezes menor do que o metro) e tem revolucionado a farmacologia mundial. O pesquisador Humberto de Mello Brandão trabalha há dez anos no desenvolvimento de nanoestruturas capazes de tornar mais eficiente a ação dos antibióticos contra a mastite.
Brandão explica que nem todos os antibióticos conseguem atuar de forma ampla para combater os agentes que provocam a mastite. Segundo o especialista, com o tratamento convencional, bactérias como o Staphylococcus aureus, grande responsável pela doença, costumam ser eliminadas fora das células fagocitárias (de defesa do organismo), mas continuam vivas no espaço intracelular. Quando a célula fagocitária morre, a bactéria fica livre e volta a se proliferar no interior do úbere da vaca, dificultando a cura dos animais tratados.
Isso explica por que essa inflamação é tão difícil de ser combatida. De acordo com Nunes, a possibilidade de se eliminar o Staphylococcus aureus durante o período de lactação, via tratamento intramamário, gira em torno de 30%. Com o tratamento da vaca seca (início do período entre as lactações) é possível obter êxito de até 80%. “Dificilmente a eliminação se dá totalmente”, afirma o pesquisador.
Numericamente, os resultados clínicos obtidos com a nova formulação, resultaram num incremento de até 15% no combate ao Staphylococcus aureus em comparação ao medicamento convencional. Brandão ressalta que esses resultados foram obtidos com a metade da dose do antibiótico. “Em nossas pesquisas, o número de animais portadores de mastite infecciosa diminuiu”, comemora o pesquisador, que completa: “o medicamento também demonstrou potencial para prevenir novas infecções”.
Como atua a nanoestrutura
A diferença entre o tratamento convencional e a utilização de nanoestruturas está basicamente em como o medicamento é carreado no organismo. Em tese, nada muda em relação ao princípio ativo em si (o antibiótico), mas no seu transporte até as células. O antibiótico é encapsulado em uma nanopartícula menor do que a célula. Essa nanoestrutura possibilita que o medicamento chegue a compartimentos biológicos que formulações farmacêuticas convencionais não têm acesso como, por exemplo, o interior das células de defesa da glândula mamária.
A partir daí, é feita uma liberação controlada e direcionada do antibiótico diretamente no local onde o agente causador da doença fica protegido das formulações convencionais. Por ser mais eficiente e utilizar de forma mais racional os antibióticos, a nanoestrutura dificulta a seleção de bactérias resistentes, aumentando a vida útil do fármaco.
O projeto de pesquisa que deu origem ao produto, que será submetido às indústrias farmacêuticas por meio de edital público, teve início em 2007. As pesquisas contaram com o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais – Fapemig e foram desenvolvidas nos laboratórios da Embrapa e da Faculdade de Farmácia da UFOP. Nesse período, foram realizados diversos ensaios para garantir a segurança do medicamento.
Mastite
A inflamação da glândula mamária das vacas tem como consequência a redução da produção, a perda da qualidade do leite, o descarte prematuro ou até a morte do animal. O controle da doença se dá por meio de práticas de manejo corretas, entre elas, a desinfecção das tetas antes e após a ordenha. A prevenção e o tratamento são realizados em todo o rebanho no período de secagem das vacas, quando é administrado um antibiótico preventivo em todos os quartos mamários do animal. Esse é um dos momentos em que o antibiótico nanoestruturado alcança maior eficiência.
Fonte: O Presente Rural.