O milho é uma cultura extremamente versátil, razão pela qual ocupa grandes extensões do Brasil. As principais vantagens da cultura são: 1) seus grãos são utilizados para várias finalidades; 2) é produto facilmente comercializado; 3) há centenas de cultivares e híbridos disponíveis. Além disso, o milho é resistente a algumas das principais espécies de fitonematoides que ocorrem no Brasil: Heterodera glycines, Rotylenchulus reniformis, Meloidogyne hapla e Ditylenchus dipsaci. Portanto, o milho é extremamente valioso como cultura de rotação ou de sucessão para o controle dessas quatro espécies. Como reverso da moeda, é suscetível a quatro outras espécies de grande importância: Pratylenchus brachyurus, P. zeae, P. jaehnie Meloidogyne incognita. Para completar o cenário, sabe-se que vários híbridos (20%-30% do total) são resistentes a Meloidogyne javanica.
No Brasil, os nematoides que causam mais perdas à soja são Heterodera glycines, Pratylenchus brachyurus, Meloidogyne javanica, M. incognita e Rotylenchulus reniformis. Do ponto de vista meramente nematológico, o milho pode ser utilizado sem restrições para o controle do nematoide de cisto da soja (H.glycines), pois todas as cultivares e todos os híbridos são resistentes, causando a redução populacional desse nematoide. A propósito, todo sojicultor sabe que a rotação ou a sucessão com milho constitui-se em efetivo método de controle de H. glycines. A mesma recomendação é válida para o nematoide reniforme (R. reniformis), cuja importância ainda é pequena, mas crescente para a soja.
A base do controle de H. glycines e R. reniformis em soja tem sido o uso de cultivares resistentes. No entanto, a rotação ou sucessão com milho são também medidas de grande valor, como alternativas ou complementos às cultivares resistentes: no primeiro caso, quando as cultivares resistentes disponíveis não são adequadas ao local, no segundo, quando se deseja um efeito aditivo.
Antes da detecção do nematoide de cisto no Brasil, em 1992, a espécie que causava mais preocupação entre os sojicultores era M. javanica, o nematoide das galhas mais comum em soja. Atualmente, a importância de M. javanica é consideravelmente menor que há 20 anos, em grande parte devido ao estabelecimento do nematoide de cisto e do nematoide das lesões como as espécies mais daninhas à soja no Brasil. Além disso, o controle do nematoide foi muito aperfeiçoado, com o desenvolvimento e a oferta comercial de muitas cultivares de soja resistentes ou moderadamente resistentes. Por fim, uma ação involuntária do agricultor provavelmente teve uma grande contribuição para o controle de M. javanica: o uso do milho como safrinha após a soja. O papel do milho está relacionado ao fato de que 20%-30% dos híbridos atualmente comercializados no Brasil são resistentes a M. javanica. Os demais híbridos são, em sua maioria, moderadamente resistentes. Poucos são suscetíveis. Neste artigo, são chamadas de plantas resistentes aquelas com fator de reprodução (FR = relação entre a população final e a população inicial) menor que 1, ou seja, que causam a redução populacional do nematoide. Plantas moderadamente resistentes apresentam FR entre 1 e 5, e plantas suscetíveis, FR>5.
Porém, é necessário se assegurar da identidade da espécie de Meloidogyne. Com menor frequência, outra espécie de nematoide das galhas ocorre em soja: M. incognita. No Brasil, não existem híbridos de milho resistentes nem moderadamente resistentes a M. incognita. Portanto, se a espécie de Meloidogyne presente for M. incognita, o milho causará grande aumento da sua densidade e, como consequência, das perdas em soja.
Não há híbridos de milho resistentes a P. brachyurus, porém, existem alguns com moderada resistência (FR entre 1 e 5). Vários agricultores fazem a sucessão soja-milho em locais infestados com P. brachyurus, mas devem estar cientes do risco de perdas em soja, que somente deve ser aceito se a perspectiva de renda proporcionada pelo milho for realmente muito positiva. Também é preciso levar em conta a densidade de P. brachyurus (o risco é maior a partir de valores superiores a 200 espécimes por 200cm3 de solo) e o grau de resistência do milho ao nematoide (suscetível ou moderadamente resistente).
Milho em sucessão com feijoeiro
Os nematoides que ocorrem na cultura do feijão são os mesmos da soja, portanto, as recomendações ao utilizar milho como cultura de rotação são as mesmas listadas para a soja. Porém, há diferenças na importância das espécies de nematoides. Em feijoeiro, as espécies que causam as maiores perdas são M. javanica e M. incognita.
Milho em rotação ou sucessão com algodoeiro
No Brasil, os nematoides que causam mais perdas ao algodoeiro são M. incognita e R. reniformis. Tendo em vista que o milho é suscetível à primeira espécie e resistente à segunda, não deve ser utilizado em rotação ou sucessão com algodoeiro em locais infestados por M. incognita, porém é altamente recomendável no controle de R. reniformis. No caso de infestações mistas, a decisão pelo uso do milho deve ser tomada com base na densidade de M. incognita, pois é a espécie com maior potencial de causar perdas ao algodoeiro. Se a densidade de M. incógnita for maior que 100 espécimes por 200cm3 de solo, esta regra é sagrada: não utilizar milho em hipótese alguma. Perdas na faixa de 30% a 50% podem ser esperadas se tal regra não for respeitada.
Outra espécie que merece destaque é P. brachyurus, que é muito comum nos algodoais do país. Felizmente, são raros os casos em que causa perdas em algodão.
Milho em sucessão com batata
Os principais nematoides da batata no Brasil são, em ordem decrescente de importância, M. javanica, M. incognita e P. brachyurus. Vale, por conseguinte, a regra de, em áreas infestadas por M. javanica, utilizar híbridos ou cultivares resistentes; em áreas infestadas por M. incognita ou P. brachyurus, não utilizar milho em qualquer hipótese. Outro quadro é a infestação mista pelas duas ou três espécies de nematoides, situação na qual, por segurança, não se deve utilizar milho.
Milho em sucessão com alface, beterraba e cenoura
Os nematoides mais daninhos à alface, à beterraba e à cenoura no Brasil são M. javanica e M. incognita. O uso do milho constitui-se em grande risco de perdas para as três olerícolas em locais infestados por M. incognita, e em moderado risco em locais infestados por M. javanica. Ambas as espécies causam perdas de igual monta para as três olerícolas, porém, a sucessão com milho é menos perigosa em locais com M. javanica, pois os híbridos de milho são, em sua grande maioria, resistentes (cerca de 20%-30% deles) ou moderadamente resistentes. Por essa razão, a identificação da espécie de nematoide das galhas é muito importante.
Em algumas regiões, como em Moji das Cruzes, a identificação tem valor ainda mais significativo. Nessa importante área produtora de olerícolas, além de M. javanica e M. incognita, outra espécie muito comum é M. hapla. Todos os híbridos de milho são resistentes a essa espécie, portanto, o papel dessa gramínea é completamente diverso do cenário com M. incognita ou M. javanica: é altamente recomendado em sucessão com alface, beterraba e cenoura, para o controle de M. hapla.
Milho em sucessão com alho e cebola
O nematoide mais importante para o alho e a cebola é Ditylenchus dipsaci (nematoide dos caules e bulbos), em todas as principais regiões produtoras do Brasil (planalto catarinense, vale do Alto Paranaíba, entre outras). O milho é suscetível a algumas raças de D. dipsaci, mas é resistente àquelas que atualmente ocorrem no Brasil. Portanto, pelo menos por ora, o milho é cultura válida para sucessão com alho e cebola, em locais infestados por D. dipsaci. Porém, os nematoides M. javanica e M. incognita também causam perdas à cebola.
Milho como cultura intercalar em cafezais
Em cafezais, as culturas intercalares trazem vários benefícios, destacando-se a proteção do solo contra erosão e dessecação e o aumento da oferta de nutrientes. Caso a cultura intercalar tenha valor econômico, acrescenta-se à lista a renda propiciada ao agricultor. No entanto, para a finalidade desta publicação, interessa saber o efeito do milho sobre os nematoides que ocorrem em cafezais. Dentre os nematoides daninhos aos cafeeiros, o milho é resistente a Meloidogyne exigua, M. paranaensis e M. coffeicola, porém suscetível a M. incognita, Pratylenchus jaehni e P. brachyurus.
Considerações finais
Em conclusão, o milho pode ser uma ferramenta de grande valor no controle dos nematoides fitoparasitas, bastando que o agricultor tenha em seu poder três informações imprescindíveis: 1) os nematoides que ocorrem em sua área; 2) os nematoides que causam perdas à cultura que será implantada na área; 3) a resistência do milho aos nematoides que ocorrem na área e que causam perdas à cultura a ser implantada.
Fonte: Grupo Cultivar